Estabelecendo Relações e Trabalhando Juntos

Este artigo trata de pessoas morando e trabalhando juntas em harmonia. Focaliza principalmente os obreiros, mas pode ser de utilidade para cristãos em geral, porque a vida para todos envolve coexistência e trabalho ao lado dos outros, tanto na nossa igreja local como no serviço cristão mais amplo; e as atitudes e comportamento que promovem boas relações são as mesmas, estando no exterior ou em nossa pátria.

Tensões Interpessoais

Alguns servos de Deus trabalham sozinhos, sem colegas que possam compartilhar dos gozos e preocupações das atividades cotidianas. Os que trabalham juntos, porém, nem sempre acham fácil estabelecer ou manter alegres relações interpessoais. De fato, às vezes o problema maior do obreiro é como combinar com os outros obreiros. Infelizmente, é verdade que muitos colapsos nas fileiras missionárias são causados não por oposição vinda de fora, mas pela dissensão de dentro.

Contendas entre líderes cristãos não é uma novidade, nem ocorre somente entre homens e mulheres espiritualmente imaturos. Os grandes apóstolos Pedro e Paulo tiveram uma confrontação forte em público em Antioquia (Gl 2:11-14), e a contenda entre Paulo e Barnabé foi tão dolorosa que simplesmente não poderiam trabalhar juntos (At 15:36-41). Lamentavelmente, neste respeito, obreiros modernos muitas vezes não fazem melhor que os seus antecessores apostólicos.

Por Que Acontece Isto?

Fatores que contribuem para a desarmonia:

Obreiros São Humanos! – São os servos de Deus, mas podem ter dores de cabeça, problemas, pontos cegos, preconceitos, paixões, dúvidas e temores. São pessoas determinadas, com persuasões profundas e sentimentos fortes. É isso que lhes fez obreiros em primeiro lugar. Mas a força que foi um incentivo para chegar ao lugar do serviço pode ser uma desvantagem no campo.

Diferenças Teológicas – Não é incomum encontrar dois obreiros, ambos dedicados a Deus, tendo ideias diferentes em certos aspectos da doutrina ou prática cristã. Se os dois têm que trabalhar juntos e os seus pontos de vista são significativamente diversos e retidos fortemente, dificuldades podem acontecer.

Conflitos de Personalidade – Personalidade é uma coisa sutil. É composta de várias entidades complexas – mente, coração e determinação – e é influenciada por hereditariedade, ambiente, educação, experiência da vida e outros fatores. Certas pessoas, quando juntas, combinam, enquanto outras, não, e muitas vezes não há explicação racional para isso. Acontece na vida secular e no campo missionário.

Peculiaridades de Conduta – Mau comportamento causa problemas. Se uma pessoa é preguiçosa, egoísta, falível, mal-humorada, censuradora, etc., é fácil ver que outros podem ter problemas em relações com ela.

Proximidade – O fato de que obreiros frequentemente são colocados em alojamentos apertados exacerba dificuldades potenciais. Comportamento que não incomodaria se encontrasse a pessoa ocasionalmente pode tornar-se insuportável ao encontrá-la diariamente.

Incapacidade de Escolher Companheiros – Viver com companheiros da própria escolha seria ideal, mas pode ocorrer de obreiros viverem e trabalharem com pessoas que não escolheram e com as quais têm pouca afinidade.

Falta de Diversão – Obreiros cristãos nos países desenvolvidos têm muitos tipos de atividades extracurriculares para fornecer variedade na rotina semanal. Obreiros nas cidades podem ter certas atividades para diversão, mas os das cidades pequenas e áreas primitivas podem se achar completamente sem qualquer tipo de recreação. Assim, o isolamento cultural pode desanimá-los e tornam-se irritáveis, quase sem saber por quê.

Atitudes Não Benéficas

Certas disposições são uma causa maior de atrito entre pessoas.

Um Espírito Crítico – Isso parece ser o Inimigo Número 1. A crítica é o maior destruidor de relações harmoniosas.

Crítica dos outros é uma prática quase universal. Há poucas pessoas que nunca cedem nisso. Muito da conversa diária entre obreiros gira em redor do trabalho de outros obreiros, e é fácil ser levado a criticá-los, pois a imperfeição não é difícil de ser encontrada.

Às vezes a crítica toma a forma de conversa inútil, sem a intenção maliciosa. Outras vezes é usada como meio de denegrir outros. Em qualquer caso, humilha o interlocutor, prejudica o ouvinte, deprecia a pessoa criticada, e é prejudicial à harmonia e comunhão do grupo inteiro.

“De todos os membros no corpo, não existe um tão aproveitável a Satanás como a língua” (Thomas Brooks).

Ciúme – Ciúme pode ser menos comum do que a crítica, mas pode ser igualmente destrutivo. Fere o próprio indivíduo e contamina sua relação com os outros que estão envolvidos.

Foi o ciúme que instigou Arão e Miriã a murmurarem contra Moisés, e a gravidade do pecado pode ser vista pela severidade do julgamento de Deus sobre Miriã (Nm 12:1-10). Encontramos o mesmo pecado nos doze apóstolos enquanto disputavam entre si acerca de qual deles seria o maior (Lc 22:24). O fato de que sucumbiram para este tipo de coisa depois de passar três anos na companhia do Homem mais humilde que já viveu é uma indicação de quão profunda é a tendência ao ciúme, mesmo entre os servos do Senhor.

Os obreiros enfrentam este problema. O obreiro que tem dificuldade com a língua pode ter inveja daquele que é linguisticamente proficiente. Pode sentir ciúme profundo do homem que é o melhor pregador. Pais obreiros querem que os seus filhos se destaquem acima dos outros. Um homem pode ficar sentido se ao outro foi dada uma posição de liderança na frente dele. Alguns obreiros são preferidos acima dos outros pelo povo nacional, e isso é duro para os obreiros menos populares ou menos dotados que chegam a se ressentir dos seus colegas mais favorecidos. O dinheiro pode se tornar uma ocasião de ciúme, quando alguém que está lutando financeiramente trabalha ao lado de um colega que obviamente é bem sustentado.

Uma forma séria de ciúme pode surgir onde uma irmã solteira mora no campo missionário junto com um casal. Se o marido é o único homem no lugar, de vez em quando haverá tempos quando ele precisará ajudar a solteira, e ressentimento pode surgir da parte da esposa, especialmente se a outra é jovem.

Onde quer que haja pessoas, haverá problemas interpessoais. Nunca será completamente eliminado, mas com raciocínio e esforço podem ser reduzidos às proporções controláveis. Existem coisas que podem ser feitas, e se todo mundo fizer sua parte, a vida para todos será mais agradável.

Na Busca da Harmonia

Acordo Doutrinal – Quando obreiros defendem teorias que discordam significativamente na interpretação das Escrituras, às vezes é melhor avisá-los para não trabalharem juntos. Onde há discórdia doutrinal entre os que lideram uma igreja, confusão e até divisão provavelmente ocorrerão.

Quando obreiros defendem teorias que discordam significativamente na interpretação das Escrituras, às vezes é melhor avisá-los para não trabalharem juntos.

Antes que um obreiro novo se junte a um trabalho existente, é prudente da parte dos que já estão no campo indagar cuidadosamente acerca do pano de fundo, experiência, crença e práticas do recém-chegado, para que unanimidade do ponto de vista concernente à doutrina essencial possa ser preservada.

É Bom Conversar – É vital que obreiros que trabalham juntos também orem e conversem juntos regularmente em grupo, para poder trocar informação, ventilar ideias, examinar objetivos, fazer planos, compartilhar problemas e encorajar um ao outro. Enquanto conversam é importante também escutar; ouvir e entender o que cada pessoa está dizendo e sentindo. Cada membro do grupo precisa ser ouvido, sentir-se estimado e ter seu valor afirmado. Harmonia floresce melhor entre os que se comunicam livremente e que respeitam, sustentam e encorajam um ao outro.

A ordem do Senhor: Jesus disse:

“Que vos ameis uns aos outros; como Eu vos amei a vós, que também vós uns aos outros vos ameis” (Jo 13:34).

Obediência a esta ordem, “Ameis uns aos outros”, é a chave para felizes relações interpessoais, quer no matrimônio, na família, na igreja, entre obreiros, ou em qualquer agrupamento em que vivem ou trabalham.

Mas o que a palavra “amar” significa realmente? Que tipo de amor é este, com o qual devemos amar um ao outro? Precisamente o que o Senhor está pedindo que façamos?

  • “Amor não é um sentido afetuoso, mas um constante desejo para o supremo bem do nosso amado até onde pode ser obtido” (Clive Staples Lewis).
  • “Amor cristão pertence antes à esfera de ação, não da emoção. Não é uma paixão involuntária e incontrolável, mas serviço desinteressado empreendido pela escolha deliberada” (John Stott).
  • W. E. Vine escreve: “Amor cristão, seja exercitado aos irmãos, ou aos homens em geral, não é um impulso dos sentidos, nem sempre acompanha as inclinações naturais, nem se gasta apenas onde descobre alguma afinidade. O amor procura o bem-estar de todos (Rm 15:2) e não faz mal ao próximo (13:8-10); o amor procura oportunidade de fazer bem a todos, e principalmente aos domésticos da fé” (Gl 6:10).

Na questão das nossas atitudes e comportamento para com os outros crentes, as ordens do Senhor são bem exigentes; e devemos reconhecer que, se falharmos em amar estas pessoas como deveríamos, estamos sendo desobedientes a Ele, seja qual for a nossa posição doutrinal. Agir de uma maneira cristã para com os nossos irmãos e irmãs (todos) não é somente um requinte desejável; é uma exigência básica do Senhor.

Em termos práticos, o amor exige que:

Sejamos Sensitivos – Examine cuidadosamente o seu irmão. Descubra o que lhe irrita e evite-o. Se ele for facilmente irritado, não o provoque. Mostremos consideração. “… Não atente cada um para o que é propriamente seu, mas cada qual também para o que é dos outros” (Fp 2:4). A nossa prioridade deve ser agradar ao Senhor. A segunda é conservar os nossos irmãos felizes.

Sejamos Corteses – O dicionário define cortesia como benevolência, bons modos, consideração dos outros. É compaixão para com os desprotegidos, consideração às mulheres, cuidados das necessidades com as solteiras, respeito para com os idosos, bondade a todos. Cortesia é um óleo que reduz fricção em relações interpessoais.

Sejamos Generosos – Generosidade está no coração do Evangelho (Jo 3:16; At 20:35; 4:32), e abrange mais do que dinheiro e bens. Inclui uma mente liberal, um espírito bondoso, um caráter magnânimo. Significa ir a segunda milha, auxiliando, fazendo mais do que é necessário. Envolve hospedar desconhecidos, ajudar nossos amigos, amar nossos inimigos, fazer bem a todos e não esperar nada em troca.

Sejamos Pacientes – Os obreiros têm a tendência de ser ativistas, constantemente em movimento. Paciência não é sempre a virtude mais aparente. Impaciência, porém, torna-se uma desvantagem em certas culturas, onde às vezes é considerado um pecado mais grave do que mentir, enganar ou roubar. Nem é aceitável desculpar a nossa irritabilidade dizendo: “Sou assim mesmo. É preciso aceitar-me como sou”. Eles não aceitam! E Deus não aceita também. Ele espera que nós mudemos! “… pondo nisso mesmo toda a diligência, acrescentai à vossa fé… paciência”, “… para que não vos deixe ociosos nem estéreis no conhecimento de nosso Senhor Jesus Cristo” (II Pe 1:5-8). Esforçar-se para ser como Cristo é parte do nosso chamado cristão.

Somos salvos sem obras, mas não nos tornaremos semelhantes a Cristo sem esforço. Sejamos prontos a perdoar: Quando um rompimento na comunhão ocorre, é importante procurar uma reconciliação prontamente e tomar a iniciativa por si mesmo em vez de esperar a outra pessoa tomar o primeiro passo.

De fato este é o caminho do Senhor. Apesar de Ele ser a parte ofendida, Ele veio nos procurar em amor e graça, para nos reconciliar com Deus. Não podemos fazer melhor, e Ele não espera que façamos menos do que seguir o Seu exemplo.

Harmonia entre obreiros faz a vida mais agradável para todos (Sl 133:1). Também terá um impacto maravilhoso para o bem do povo que estamos tentando influenciar para Deus (Jo 13:35). E acima de tudo foi a oração do nosso Senhor para que o Seu povo fosse um (Jo 17:20-21), unido em mente, em propósito e em amor um para com o outro; dessa maneira por causa d’Ele desejaremos fazer todo o possível para edificar e manter laços entre nós e os nossos colegas no serviço de Deus (Ef 3:1-4; I Cor 1:10).

John McQuoid – “Echoes Missionary Magazine” – Tradução: Jaime Crawford.

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